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segunda-feira, 29 de abril de 2013

Uma vida, um botão

Girava o botão do punho esquerdo, duas vezes, já que tinha feito o mesmo com o direito. Acabou que arrancou... Tiro o outro?, pensou apertando os beiços. Pôs no bolso, enfim, protelando a decisão.

Estava atrasado e com a mente cansada demais para elaborar as devidas satisfações - ademais, de todo modo ela irromperia a mesma cara culpando-o pelo amargor de sua suposta TPM (diária). Interrompeu o passo: Relacionamentos podem ser cansativos às vezes... Ô, dia cheio!

Menos de três quadras da lanchonete de sempre. Esbarrou com o olhar de um estranho que, como manda o manual social, desviou para que cada qual prosseguisse seguro em sua própria solidão. Uma indiferença mal-encenada, só não mais patente que aquela que infligimos a um pedinte.

Parou novamente, aguardando o sinal. Mais alguns estranhos dividiam a calçada com pressa e quase empurrando-o aos automóveis. Animais! Sentiu um riso, talvez por seu terno barato e envelhecido, pensou envergonhado e autocensurando-se. Talvez não - era só ver dentes e lhe vinha essa impressão.

Olha para os dois lados da rua, mas resolve andar um pouco mais, fora do caminho habitual - a casa provavelmente estaria no mesmo lugar quando voltasse... Algumas ligações perdidas no celular, que prontamente desligou. Seguiu com um botão no bolso, outro por arrancar e uma ereção.

terça-feira, 9 de abril de 2013

Bia

A compressa de camomila geladinha vai fechando os poros enquanto emagrece o olhar semi-morto - consciência que uma noite mal dormida revela sobre a idade. Com a visão e os cabelos desembaraçados do sono, agora sim, o dia começa.

Exceto pelo par de pantufas, Bia só abandona o quarto quando o espelho não deixa dúvida: impecável. Ela mesma acha graça no fato de parecer um personagem por usar sempre a combinação de camisa recatada, saia florida e maquiagem minuciosamente feita para não parecer maquiagem.

"Uma daquelas mulheres de comercial de margarina patriarcal", brinca fazendo beicinho. Apesar de independente (e de nem gostar de margarina), lhe agradaria um homem desse tipo "provedor", ficar em casa entretendo-se com as tarefas, com o mercado e as violetas teimosas à janela. _ Ainda troco por plástico!, aborrece-se.

Família, apenas mais um de seus sonhos imprecisos... Desde os 14 cuidando do lar e da mãe enferma, nunca tivera muito espaço para si. Na sala do minúsculo apartamento a vela que nessa semana do ano deixa religiosamente acesa arde perigosa ao lado do retrato de Dª Miriam - de quem herdou sua mania de limpeza, lembra olhando rancorosa para uma mancha no chão.

O tico de leite transborda na chaleira, única lembrança do velho, e a indecisão sobre chegar atrasada no trabalho ou limpar logo a torturará até inevitavelmente correr pro ponto de ônibus mascando umas bolachas amanhecidas. O único conforto é a sensação de adeus vinda com a sucessão de paisagens à janela - a janela que a salvará da ausência de verde de seu bairro e das caras aborrecidas no veículo. Descruza e recruza as pernas.


_ As mesmas caras..., pensa alto e logo recriminada por algum franzir de testa. A carapuça em verdade é para os infinitos clientes cuja voz abafada a sufocam diariamente no atendimento telefônico. Talvez fossem mais simpáticos se vissem como é bonita... Mas são todos iguais, assim como a voz de atendente de telemarketing...

Espia, com o mesmo olhar fúnebre de quando acordou, o nome "Fábio" no crachá. "Gente bonita é melhor tratada", resmungava repetindo para si que aquilo era temporário, como tudo.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

Ser interessante?

Olhares, [amarelos] sorrisos, assuntos (!); escoltados por uma tensão que brota espontaneamente quando se está a conhecer quem quer que seja (aliás, uma das poucas coisas espontâneas entre humanos modernos...).

Conversa vai, conversa vem, e aos poucos as maquiagens sociais vão borrando. À vista amizades, beijos, aquele emprego novo. Ou não, caso os santos cricris definam que são da paz e "não batem" (perdão ao trocadilho).

Infelizmente, alguns macaquinhos não possuem sensibilidade suficiente pra saber distinguir os tipos de desejo que (não) despertam - ou simplesmente ignoram as entidades citadas - e chegam a indagar o óbvio. Como carência cega o amor próprio, viu...

O engraçado é que, não raro, contribui para a apatia/antipatia justamente querer conquistar o ego alheio (excluamos os puxa-sacos, que não merecem consideração ^^). Aquela falsa atenção estampada com as clássicas balançadinhas de cabeça, os sorrisos burocráticos, a pedância, o tempo frio, quente ou chuvoso... Por que, afinal, a preocupação com ser ou não "interessante"?



"Seja você mesmo", diz o imperativo desgastado e paradoxalmente pouco usado, especialmente com leveza... Soa clichê feio ler e bordão irritante ouvir, mas de início é o melhor (e é tudo o que) você pode oferecer.

Se isso não for suficientemente interessante para o outro, melhor encontrar alguém que lhe enxergue e goste do que vê: qualidades e defeitos. Alguém que, pelo simples fato de ter escolhido sua companhia, te faça querer (inspire a) ser uma pessoa melhor.

É muito pobre querer ser/parecer melhor/interessante pra chamar atenção de alguém (Além de bem cansativo; até peidar fica difícil haha)

Liberdade!

Se é pra se esforçar pra conquistar alguém, que seja para você mesmo. Sem narcisismos, poder olhar de vez em qdo pr'aquele ser no espelho e sorrir. Isso com certeza vai refletir nos diversos espelhos (da alma) que nos captam, admiram, ignoram?, julgam todos os dias, cada qual com uma imagem e conceito diferente...

Agora, se isso não for interessante pra si próprio...
Melhor enfiar a cara na novela mesmo