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segunda-feira, 29 de abril de 2013

Uma vida, um botão

Girava o botão do punho esquerdo, duas vezes, já que tinha feito o mesmo com o direito. Acabou que arrancou... Tiro o outro?, pensou apertando os beiços. Pôs no bolso, enfim, protelando a decisão.

Estava atrasado e com a mente cansada demais para elaborar as devidas satisfações - ademais, de todo modo ela irromperia a mesma cara culpando-o pelo amargor de sua suposta TPM (diária). Interrompeu o passo: Relacionamentos podem ser cansativos às vezes... Ô, dia cheio!

Menos de três quadras da lanchonete de sempre. Esbarrou com o olhar de um estranho que, como manda o manual social, desviou para que cada qual prosseguisse seguro em sua própria solidão. Uma indiferença mal-encenada, só não mais patente que aquela que infligimos a um pedinte.

Parou novamente, aguardando o sinal. Mais alguns estranhos dividiam a calçada com pressa e quase empurrando-o aos automóveis. Animais! Sentiu um riso, talvez por seu terno barato e envelhecido, pensou envergonhado e autocensurando-se. Talvez não - era só ver dentes e lhe vinha essa impressão.

Olha para os dois lados da rua, mas resolve andar um pouco mais, fora do caminho habitual - a casa provavelmente estaria no mesmo lugar quando voltasse... Algumas ligações perdidas no celular, que prontamente desligou. Seguiu com um botão no bolso, outro por arrancar e uma ereção.

segunda-feira, 16 de abril de 2012

Perigoso

_ Tédio...

_ Que há?

_ Não há; sem nada pra fazer.

_ Coisas a fazer sempre há... Depende do que se quer (e da disposição em fazê-lo). O tédio existe porque deixamos...

_ Que fazes, então, Boris?

_ Conferindo meu signum, se fiz tudo certo hoje...

_ Por isso gosto de ti; vives perigosamente!

_ Não se engane, "viver é muito perigoso..."

sábado, 14 de abril de 2012

20 Minutos

O ônibus para e boa parte dos passageiros desce. Uns apressados, provavelmente pelos ditames do líquido mal-aprisionado no corpo; outros menos, ainda acomodando os olhos indecisos à luz fria e aos produtos caros da loja de conveniências (?). E há a turma da fumaça, claro.

20 minutos a parada; tempo para deixar um cadáver no banheiro.

Norma suspira nervosa. Apoia a outra nádega na poltrona e tenta retomar o sono que não dormia. O rosto, untado em suor, lembra uma armadilha para insetos. Por que, afinal, desligam o ar-condicionado?

Sombras esgueiram-se de volta a seus assentos, umas ainda baforando a fumaça da última tragada à porta. Malditos, pensa, desejando sombriamente que morram de câncer...

A movimentação desperta algumas almas cansadas da viagem. Uma ou duas cutucam seus celulares. Outras remexem sacolas e começam a moer ruidosamente seus biscoitinhos, salgadinhos...

O sujeito adiante continua com seus "inhos" afins. Comprou agora? Trouxe previamente consigo para o momento mais inconveniente? créc... crréc... crrréc.... Devagar comia, consciente do desagravo social em meio ao silêncio. Novo suspiro... Por que não come logo essa mer...?!

Alguém resolve manifestar-se, crente de que o barulho no celular levaria a mensagem em prol do silêncio, mas que no máximo propaga o sexismo presente na música brasileira de mais baixa criatividade...

Madrugada. 20 minutos passados; era tempo de deixar um cadáver no banheiro... Norma está cheia de pensamentos sombrios.

quarta-feira, 14 de março de 2012

Memória Offboard

Fotos que você gostaria de rever daqui 20~30~40 anos...
Textos que você segredou - pensamentos, medos, tristezas contidos ali nas palavras... (Sempre ficam menores quando escritos.)
Músicas que você passou dias ouvindo/cantando o dia todo sem parar... (ou uma "vida" baixando na net discada das antigas haha) Sabe "aquela"?
Filmes que protelou assistir, por preguiça ou falta de companhia...
Tantos guardados...

Talvez alguém mais entusiasta da exposição virtual não sentisse, mas eu senti, em mim, o baque de um HD de 2 teras atingindo o chão (numa morte "instantânea" e "indolor", como dizem sem nunca apresentar depoimento do falecido a respeito).
Seria meio paranóico ter backup do backup, mas teria sido o caso "Vai que..."

Hoje em dia tantas pessoas têm "backup" público de suas coisas, em redes sociais e em flogs. Não, não me arrependo de não ter esse tipo de "backup" online de tudo (E nem quero. Apreciaria é ter um backup do meu corpo, pra quando as peças começarem a apresentar defeito). Afinal, o importante está na cabeça, disponível a quem de interesse, enquanto a saúde permitir.

Nesse pique, logo chegamos ao extremo de algo como naquele filme com Robin Williams, Violação de Privacidade (The Final Cut), em que tudo o que os indivíduos viam e ouviam era gravado, para a posteridade, em um chip implantado no cérebro antes mesmo de conseguirem coordenação para resolver qual dedo chupar. Perigoso, não?

Agora: um chip pra expandir a memória seria ótimo - "instalar" a enciclopédia no cérebro ou até armazenar todas aquelas posições de ioga, das dolorosas às ridículas. #MatrixFeelings

Enfim... [Minuto de silêncio]

Lembro daquela criança arisca, avessa às lentes, que tomava banho de rio vestido dos pés à cabeça, que ficava (ou fitava?) num canto da porta ou da casa todo sério, limitando-se aos burocráticos cumprimentos àquelas visitas de familiares extrangeiros e semi-conhecidos. Tímido, ex-tímido.

Sempre quis ter imagens dessa época, embora não tenha colaborado um tico sequer (custou arrancar algumas parcas fotos em posse de tias corujas). Não por nostalgia, mas pela graça de ir vendo -e comparando- como as coisas foram andando e desandando. Geralmente notamos como éramos bobos e menos feios do que imaginávamos (?) - não que eu precise de 20~40 anos pra saber o quanto sou bobo hoje, mas seria legal.

De qualquer forma, foi mais uma lição/oportunidade de desapego; útil "incentivo" a livrar-se de coisas velhas que só fazem volume (como aquelas roupas que você nunca lembra de doar).

Desapego é uma das coisas que deixam a vida mais leve e possibilitam estar bem com a idade e com o envelhecer. Já que ficamos velhos mesmo, e coisas serão perdidas, e ganhas, e aprendidas... Pra depois morrer!

sábado, 24 de dezembro de 2011

Pode me dar um abraço?


Foto de Fabio Sabatini: Can't Stop The Self-Hug

Estava sentado no banquinho da praça desligado do planeta, exceto pelo ventinho e o sol teimando em atravessar os escuros óculos.

Psiu, fez a senhora no banco ao lado.Um pouco cismado (não são só os animais que têm o prudente medo do bicho homem), atendeu ao pedido e avizinhou as nádegas lá do ladinho.

Em tom de clarividência perguntou se era paulista. "Essa velha quer me comer, só pode".Sim, respondeu, foragido.

Sem coordenação suficiente nas mãos, a estranha pediu que pegasse o isqueiro e o cigarro. Mesmo odiando esse tipo de incenso, acendeu só para ver aonde daria (câncer!, torceu sombriamente).

Já íntima, contou que tinha depressão e que estava esperando não sei o que para ir no aniversário da filha. Devia ser mais uma daquelas que a velhice e a decepção tirou o juízo para lhe conceder no imaginário aquilo que não conseguiu colocar em seu enredo mundano...

Ouviu-a até o silêncio e a vontade de voltar à brisa solitária vierem. Logo não titubeou muito em fingir chegar alguém que esperava.

Você pode me dar um abraço? Não, isso eu não posso não, senhora. E despediu-se.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

Domingo de cinzas

Súbito volto daquela viagem extracorpórea que todos fazemos ao abrir a geladeira ou ao cutucar grãos de arroz no prato, um a um.

A amnésia cobria alva o que quer que estivesse ocupando os pensamentos e Bono já desafinava o refrão de Sunday Blood Sunday no mp3-player...

Que cena ridícula! ali, sangrando, de cuecas, com a navalha na mão...



Maldita espinha! (O despeito é comprimido nos lábios ao canto da boca enquanto colo um picote de papel higiênico. )

Afasto-me do espelho e examino com toda hipocondria os ossos espetando a pele já cedendo ao calor...
22:10 no relógio... Dou conta da mania que peguei de olhar as horas. Mais essa!

Que será que os outros caras fazem pra matar, digo distrair, o tempo numa noite de domingo (descontando o que não se pode/quer agora)?
TV não! Exercícios físicos? Raspam a cara pra ter que fazer de novo pela manhã? Dançam? Escrevem bobagens? Masturbam-se? Não, melhor TV... (!!!) Se bem que o Carnaval está a assombar...

No mp3 continuam as músicas tristes. Aquele pensamento submergiu da geladeira, mas é melhor ir deitar (a algumas idéias é bom não dar muita trela).

quinta-feira, 22 de novembro de 2007

Inobjetivamente...



Sentou-se, ensaiou algum gesto vago... Não.
Descansa as têmporas nas mãos - até que o pulsar das veias incomode...
Suspira fundo: mecanicamente... Os pulmões tateiam aerofóbicos o ar...

Nada. Tudo o que tem a oferecer ao retângulo, fatalmente branco, são fragmentos que amontoam-se vagos num mosaico de realidade borrada como o de que se cercam aqueles que perderam a capacidade de sentir fome.

Mas havia algo... Sim: "pléc", fez a pedrinha. Ele sorriu, satisfeito; havia fundo...

Levantou-se e foi comer uma banana